sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

"Esse é o problema das mulheres. Acham que os homens são todos iguais porque são completamente incapazes de prestar atenção a pormenores."

O gosto amargo de um café queimado e uma teoria barata, em troca daquele sorriso. O sorriso familiar que já vira em tantas mulheres. Parecia-lhe sempre ouvir nestes momentos um som de paredes a ruir. Eram as primeiras barreiras que se quebravam. Afinal, as mulheres são todas iguais.

"Mas os homens não são assim - nós sabemos que todos os seres humanos são únicos. E um homem é perfeitamente capaz de reconhecer em qualquer mulher o que a torna diferente de todas as outras. Não é a beleza, porque belezas há muitas, e é possível encontrar beleza em todo o lado. Também não são as ideias, porque a conversa torna-se sempre aborrecida ao fim de algum tempo. E também não é nada de primitivo, não é só um sentimento como paixão, amor ou luxúria, porque senão o próprio sentimento seria sempre igual. E não é. Cada mulher desperta uma sensação diferente num homem."

O sorriso transforma-se levemente num ângulo de pescoço, um ligeiro tombar de cabeça. É o segundo momento, a segunda parede que desaba. Ela já nem escuta exactamente o que ele diz, já não atribui significado às palavras que ele profere. As palavras já são só música. Ela simplesmente deixa-se permanecer na cadeira desconfortável, de tronco chegado à frente, cotovelos apoiados na mesa, pés cruzados atrás, e permite-lhe que a encante com a sua voz. Como a uma serpente.

"Quando digo que todas as mulheres são únicas, o que quero dizer é que cada uma sorri de uma maneira, e cada sorriso significa uma satisfação diferente. Quero dizer que cada uma se mexe de uma só maneira. Cada uma tira a roupa de uma só maneira. Cada uma diz-nos coisas ao ouvido na almofada que só ela diz. Tudo isso é um traço seu; é irrepetível e inimitável."

A última parede cai por completo quando ela decide falar, supostamente contrariando-o, mas unicamente dando-lhe mais uma possibilidade para brilhar; mais uma oportunidade para fazê-la vibrar.

"E é por isso que tu és um cabrão?"

"Se me quiseres chamar isso... sim, é. E repara, se as mulheres conseguissem ver isto com tanta clareza como os homens, seriam iguais. Não faz sentido estarmos sujeitos sempre aos mesmos gestos, às mesmas palavras, ao mesmo dia-a-dia, com uma só pessoa. Não faz sentido quando há todo um Mundo lá fora cheio de novidade e de experiências para viver com outros seres únicos."

Ela pega-lhe na mão. Vitória. Não ficou um único tijolo sobre tijolo. As mulheres são todas iguais.

"Tens razão. Conheces tão bem as mulheres, e as relações, e as pessoas... Deixas-me sem palavras."

"E então o que dizes à minha proposta?"

"Lamento, mas não. Sabes, eu sou apenas mais uma mulher. E a conclusão do que estás a dizer é que somos todas diferentes, mas ao mesmo tempo também somos todas igualmente incapazes de ver como seríamos mais felizes se fossemos mais soltas. Assim sendo, lamento, mas iria sentir-me muito mal por não ser capaz de te devolver essa lucidez."

"Ora, isso é conversa. Não tens que me devolver nada. Vem só comigo."
Quem diria que as paredes se erguem com a mesma velocidade com que se deitam abaixo. E foi com toda a graciosidade que, erguendo-se da mesa, vestindo o casaco e deixando dinheiro para pagar a sua bebida, ela colocou o ponto final na discussão.

"Não posso. Tu também és único, e para fazeres valer a tua ideia de vida e seres coerente... acho sinceramente que devias passar a querer estar com homens. Afinal, só outro homem verá o que há de único em ti. Para mim, vais ser sempre igual aos outros."



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